quinta-feira, 25 de junho de 2009

Bê-a-bá Jurídico

Hoje abordaremos três tipos de prisão cautelar, ou seja, aquela que não necessita de uma decisão condenatória de que não caiba mais recurso para ser efetivada. Em outras palavras, não se confundem com a prisão para o cumprimento de uma pena. São as prisões em flagrante, temporária e preventiva.
A prisão em flagrante é uma exceção à regra que exige uma ordem judicial para prender alguém. Dessa forma, qualquer pessoa (isso mesmo que você leu), autoridade policial ou não, pode deter o autor de um delito, imediatamente.
Ademais, como não é necessário ordem judicial, a prisão será submetida à avaliação do juiz que poderá relaxá-la se verificar a ocorrência de ilegalidades.
O artigo 302 do Código de Processo Penal estabelece as hipóteses em que o flagrante poderá ocorrer. Vejamos:
· Quando o sujeito está cometendo o crime. Esta situação, por óbvio, não necessita de maiores explicações;
· O sujeito acabou de cometer o delito, ou seja, José é surpreendido após disparar tiros em seu desafeto, por exemplo;
· Quando o sujeito é perseguido, logo após, em situação que faça presumir ser autor do delito. Neste caso, o indivíduo já concluiu a infração penal, mas sem ser preso no local, consegue fugir e é perseguido. Por exemplo, Antônio atira na vítima e sai da casa desta com a arma na mão e é perseguido pela polícia.
· O sujeito é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele o autor do crime. Por exemplo, a vítima após ter o carro roubado, aciona a polícia que em momento posterior encontra o autor do delito com o veículo.
A prisão preventiva, por sua vez, necessita de mandado judicial e, também, preencher alguns requisitos para sua efetivação, além de prova da existência do crime (é preciso ter certeza de que o crime ocorreu) e indício suficiente de que o acusado foi o autor do delito.
Você deve estar curioso para saber quais são esses requisitos. O artigo 312 do Código de Processo Penal sacia a sua curiosidade. Vejamos:
· Garantia da ordem pública. Este requisito, em regra, está relacionado à periculosidade do agente, ou seja, é uma forma de evitar que ele cometa novos crimes e, assim, manter a ordem na sociedade.
· Garantia da ordem econômica. Trata-se de uma espécie do gênero anterior e busca impedir que o agente causador de abalo econômico-financeiro permaneça em liberdade, caso típico dos chamados crimes de colarinho branco.
· Conveniência da instrução criminal. Nesta hipótese, a finalidade é evitar que o sujeito desapareça com provas do crime, como por exemplo, apague vestígios, suborne ou ameace testemunhas.
· Assegurar a aplicação da lei penal. Evindencia-se quando houver risco de fuga do autor do delito.
Por fim, há a prisão temporária, criada pela Lei 7.960/89. O objetivo dessa prisão é assegurar uma investigação policial eficaz, quando se tratar de apuração de crimes graves, como homicídio doloso (aquele em que há intenção de matar ou assunção do risco de provocar a morte ); estupro; sequestro, dentre outros.
Para finalizar, é importante dizer que esse tipo de prisão só pode ser decretada no curso de um inquérito policial e tem um prazo certo e determinado, 5 dias, prorrogável por igual período, em caso de extrema e comprovada necessidade. Para os crimes hediondos (Lei 8.072/90), como o tráfico de drogas, o prazo é de 30 dias, também prorrogável por igual período. Isso significa que ao término do prazo e não sendo necessário prorrogação, o indivíduo deve ser posto em liberdade.
É isso.
Darlyane Mourão Chaves

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Medida Provisória e Regularização Fundiária

No início do mês de junho do corrente ano um tema foi destaque na imprensa e causou preocupação no tocante à preservação da Amazônia: a aprovação da Medida Provisória número 458 de fevereiro de 2009, que dispõe sobre a regularização fundiária das ocupações incidentes em terras situadas em áreas da União, no âmbito da Amazônia Legal.
O sítio http://oglobo.globo.com/economia/mat/2009/06/05/marina-silva-apela-lula-contra-regularizacao-fundiaria-756210075.asp publicou uma matéria na qual a ex-ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, solicitou formalmente ao Presidente Lula o veto de determinados artigos contidos na MP 458/09. A ex- ministra alegou que o objetivo da regularização fundiária foi distorcido no texto aprovado pelo Senado (que não acatou as emendas à Medida Provisória) e criticou as lacunas criadas para anistiar “aqueles que cometeram crime de apropriação de grandes extensões de terras públicas”, os grileiros.
Assim, é imprescindível explicar qual o procedimento de criação da medida provisória e em quais casos há permissão constitucional para a sua elaboração.
A medida provisória possui a peculiaridade de surgir apenas pela manifestação exclusiva do Presidente da República, sem a participação do Poder Legislativo, sendo chamado a discuti-la em situação futura, quando já adotada pelo Executivo e produzindo efeitos jurídicos.
Não obstante, as medidas provisórias para serem legitimadas e possuírem força de lei precisam atender a pressupostos formais e materiais. Os pressupostos formais são a relevância e urgência, os materiais, por sua vez, dizem respeito às matérias que podem ser regulamentadas pelas MPs. Ressalte-se que as restrições para legislar foram dispostas no artigo 62 da Constituição Federal, como por exemplo, não podem versar sobre nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos, direito eleitoral, direito penal, dentre outros.
Podemos verificar as características de elaboração das medidas provisórias da seguinte forma:
∙ Competência exclusiva e indelegável do Chefe do Poder Executivo, ou seja, é ato unilateral do Presidente da República e sua atribuição não pode ser transferida.
∙ Deverão ser observados pelo Presidente da República, no momento da edição da medida provisória, os pressupostos constitucionais de relevância e urgência. Posteriormente serão verificados pelo Congresso Nacional onde a decisão de cada uma das Casas sobre o mérito da medida provisória está vinculada à verificação prévia dos pressupostos formais (relevância e urgência) e materiais.
∙ As medidas provisórias terão eficácia imediata, mas a perderão desde sua edição, se não forem convertidas em lei, no prazo de 60 dias (que se suspende no recesso parlamentar), prorrogáveis por igual período, contados de sua publicação no Diário Oficial. Ou seja, caso o Congresso não aprecie a mediada provisória após o período de 120 dias ela perderá seus efeitos desde sua edição.
Se a medida provisória não for apreciada em até 45 dias contados de sua publicação, entrará em regime de urgência, subsequentemente, em cada uma das Casas do Congresso Nacional, ficando paralisadas todas as demais propostas legislativas da Casa em que estiver tramitando, até que se conclua a votação.
∙ A medida provisória, depois de editada pelo Presidente, será apreciada de imediato pelo Congresso, cabendo a uma Comissão Mista de deputados e senadores examiná-la e sobre ela emitir parecer. Em seguida, a MP será submetida à apreciação pelo Plenário de cada uma das Casas, sendo que o processo de votação será em sessão separada tendo inicio na Câmara dos Deputados e, posteriormente, no Senado, a casa revisora.
∙ A Constituição veda a reedição de MP na mesma sessão legislativa (esta configura o período de 1 ano) que tenha sido rejeitada pelo Congresso, ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo.
Assim, diante das características de criação da medida provisória podemos inferir que após sua edição pelo Presidente da República, o Congresso poderá:
Aprová-la sem alteração de mérito: será o texto promulgado pelo Presidente da Mesa do Congresso (a mesa do Congresso é presidida pelo Presidente do Senado Federal) para a publicação;
Aprová-la com alteração: quando há emendas, ou seja, matérias correlatas ao conteúdo da MP. O projeto de lei de conversão verificado por uma das Casas deverá ser apreciado pela outra, devendo ser posteriormente, levado à análise do Presidente da República para sancionar ou vetar a lei de conversão.
Rejeitar tacitamente: acontece quando a medida provisória não é apreciada pelo Congresso Nacional no prazo de 60 dias, prorrogáveis por igual período, contados de sua publicação Nesta hipótese, ocorre a perda de sua eficácia desde a edição o que enseja a obrigação de o Congresso disciplinar as relações jurídicas dela decorrentes por decreto legislativo. Caso não seja editado o decreto até 60 dias após a perda de eficácia da MP as relações jurídicas constituídas e decorrentes de atos praticados durante sua vigência conservar-se-ão por ela regidas. Dessa forma, a medida provisória rejeitada volta a ter efeitos para as situações já constituídas.
Rejeitar expressamente: ocorre no caso de o Congresso expressamente deixar de converter a medida provisória em lei. Neste situação, também, deverá disciplinar os efeitos dela decorrentes por meio de decreto legislativo.
Agora podemos compreender o pedido da ex-ministra Marina Silva para que o Presidente Lula vete determinados artigos da MP 458/09. Como esta medida provisória teve emendas, cabe ao Presidente sancionar ou vetar a lei de conversão, ou seja, caso o Chefe do Executivo concorde com o projeto de lei, ele o sancionará, porém se discordar por entendê-lo inconstitucional ou contrário ao interesse público poderá vetá-lo. O veto será total se recair sobre todo o projeto, e parcial se atingi-lo em parte. Ademais, o veto parcial somente abrangerá texto integral de artigo, de parágrafo, de inciso ou de alínea.
No entanto, o veto é relativo, ou seja, não impede de modo absoluto o andamento do projeto. Assim, se o Presidente decidir pelo veto total ou parcial deverá comunicar os motivos, no prazo de 48 horas, ao Presidente do Senado Federal.
Por fim, o veto será apreciado em sessão conjunta da Câmara e do Senado, dentro de 30 dias a contar de seu recebimento. Obtendo-se o voto da maioria absoluta dos membros das Casas do Congresso, em votação secreta, o veto poderá ser rejeitado e produzirá os mesmos efeitos que a sanção. Com o veto afastado, o projeto deverá ser enviado ao Presidente para promulgação.
Vivian Brito de Amorim

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Bê-a-bá Jurídico

A Constituição Federal em seu artigo 5˚, XXXVI, preceitua que a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Mas qual o significado de cada um deles?
O direito adquirido é o que já se incorporou definitivamente ao patrimônio e à personalidade do seu titular, de modo que nem a lei nem um fato posterior podem alterar tal situação. Há, nesta hipótese, um direito concreto, subjetivo como no caso de um servidor público completar os requisitos necessários à aposentadoria e optar por continuar em atividade. Ele terá direito adquirido ao regime que vigorava no momento em que preencheu os requisitos. Ou seja, lei posterior não poderá alterar as regras da aposentadoria desse servidor.
Já o ato jurídico perfeito é aquele realizado, acabado segundo a lei vigente ao tempo em que se efetuou, pois satisfez todos os requisitos formais para gerar a plenitude de seus efeitos, tornando-se, assim, completo. Um exemplo disso é quando a lei que previa um prazo para apelação de 15 dias, foi modificada, passando a prever um prazo de 5 dias. As pessoas que já interpuseram esse recurso não serão afetadas, pois como dispõe a Constituição brasileira a lei não prejudicará o ato jurídico perfeito.
E a coisa julgada é o status conferido à sentença judicial contra a qual não cabe mais discussão, ou seja, em que não mais seja possível a interposição de recursos.
Camila S. Lugão.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

CPI da Petrobras

Nos últimos dias um assunto esteve presente nos meios de comunicação do país e fez surgir indagações de cunho político e jurídico: a CPI da Petrobras.
Suspeitas de irregularidades na mudança de regime tributário pela estatal, indícios de fraudes em licitações para reformas de plataformas, superfaturamento na obra de uma refinaria, desvio de “royalties” e irregularidade no uso de verbas de patrocínio foram os motivos que ensejaram a criação da CPI.
Tudo isso já foi objeto de análise pela imprensa e só o tempo dirá se procedem ou não as suspeitas. A nossa finalidade é explicar em que consiste uma CPI e quais as implicações jurídicas.
A princípio, é importante destacar que o Poder Legislativo tem como funções predominantes, legislar e fiscalizar.
O poder de fiscalizar pode ser dividido em político-administrativo e financeiro-orçamentário. O primeiro tem como finalidade analisar a gestão da coisa pública e tomar as medidas necessárias. Ao segundo, a cargo do Tribunal de Contas da União (TCU), compete a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial do Poder Executivo.
Nesse contexto, o que nos interessa, por ora, é a fiscalização político-administrativa realizada pelas CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito).
A CPI poderá ser criada em conjunto ou separadamente pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal, mediante requerimento de um terço de seus membros e, ainda, com prazo certo de duração.
No caso da Petrobras, a CPI foi instaurada no Senado e tem 11 integrantes.
A Constituição Federal atribui à CPI poderes próprios das autoridades judiciais. Entretanto, esse poder é limitado, já que a apuração deve ter como objeto um fato determinado, específico e relacionado ao Poder Público.
Por óbvio, nada impede que os fatos que surgirem no decorrer da investigação, relacionados ao principal, sejam também analisados, bastando apenas a inclusão deles de forma expressa.
Quando se diz que a CPI é dotada de poderes próprios das autoridades judiciais é preciso que essa afirmação não seja interpretada literalmente. Sabe por quê?
Há no Direito o conceito de “cláusula de reserva jurisdicional”. Assim, parece algo complexo e de difícil compreensão, mas não é.
Essa expressão enorme significa que a Constituição Federal estabeleceu competências exclusivas aos órgãos do Poder Judiciário, ou seja, somente aos juízes cabe a prática de determinados atos.
Você deve estar se perguntando quais são esses atos que não podem ser praticados pela CPI. Dou-lhes alguns exemplos:
· Decretar prisão, salvo em flagrante delito;
· Impedir a assistência dos advogados aos investigados;
· Invadir domicílios;
· Interceptar comunicações telefônicas (interceptar é a captação e gravação de conversas telefônicas, no mesmo instante em que ela se realiza, por terceiro sem o conhecimento dos interlocutores).
Vimos o que não é permitido à CPI, mas é imperioso destacar alguns poderes investigatórios permitidos, como:
· “Quebrar” sigilos bancário, fiscal e de dados (aqui há possibilidade, inclusive, de acesso a dados telefônicos, registro de chamadas, horário);
· Oitiva de testemunhas (se preciso com condução coercitiva);
· Determinar busca e apreensão;
· Ouvir os investigados (a Constituição assegura o direito ao silêncio como forma de não produzir provas contra si mesmo. Por isso, não é raro a concessão de “habeas corpus” àqueles chamados a prestar esclarecimentos).
Concluída a CPI, se for o caso, as conclusões serão enviadas ao Ministério Público para que promova a responsabilidade dos infratores.
Vale ressaltar que quaisquer abusos cometidos pelos parlamentares no decorrer das investigações serão controlados pelo Poder Judiciário, em respeito à dignidade da pessoa humana.
Assim, é fundamental um equilíbrio entre a satisfação dos interesses buscados com a instauração de uma CPI e os direitos dos cidadãos porventura investigados. Somente dessa forma será possível realizar a justiça e garantir transparência, fatores essenciais para a efetivação da democracia.
Darlyane Mourão Chaves

quarta-feira, 3 de junho de 2009

Bê-a-bá Jurídico

Injúria qualificada e Racismo
Um assunto que frequentemente gera dúvida é a diferença entre injúria qualificada ou preconceituosa e racismo.
Fatos abordados pela imprensa induzem ao erro quando tratam os casos de injúria qualificada como se fossem crime de racismo. Mas há uma distinção significativa entre os dois crimes: enquanto o primeiro está previsto no Código Penal ( artigo 140, parágrafo 3°) e se caracteriza quando é empregado a uma pessoa com o intuito de ofender sua honra subjetiva, ou seja, o que cada indivíduo pensa de si mesmo acerca de suas qualidades físicas, intelectuais ou morais; o segundo está previsto na Lei 7.716/89 e se verifica por discriminar determinadas pessoas com o intuito de segregação.
Assim, por exemplo, quando se chama alguém de “burro”, “vagabundo”, “negro fedorento” o agente estaria atingindo a autoestima da pessoa, a avaliação que ela faz de si mesma; estaríamos diante de um crime de injúria. Por outro lado, se uma determinada empresa negasse emprego a judeus ou certo restaurante impedisse o acesso de negros, teríamos o crime de racismo.
Outra diferença importante é que o racismo é inafiançável, imprescritível e sujeito à ação penal pública incondicionada. Logo, o agente preso em flagrante não pode efetuar pagamento de fiança e responder ao processso em liberdade; a imprescritibilidade refere-se ao fato de que pelo decurso do tempo o Estado não perde o direito de punir; e é de ação penal pública incondicionada porque desnecessária a manifestação da vítima para propositura da ação. Já a injúria é ação de natureza privada, ou seja, depende da vontade da vítima para que seja proposta; é cabível a fiança e prescreve em 8 anos.
Dessa forma, podemos notar que o crime de racismo recebe tratamento mais rigoroso, pois o legislador teve o intuito de proteger a dignidade da pessoa humana e evitar qualquer tipo de segregação, ou seja, discriminação em razão de raça, cor, etnia, religião, ou nacionalidade.
Vivian Brito de Amorim